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Vídeo mostra PMs e adolescente na Segunda Ponte antes de ele se afogar

Vídeo mostra PMs e adolescente na Segunda Ponte antes de ele se afogar

De acordo com a denúncia do Ministério Público do Espírito Santo, militares teriam arremessado Kaylan Ladário dos Santos de uma altura de 14 metros

Bruno Nézio

Reporter / [email protected]

Publicado em 7 de junho de 2025 às 16:45

De acordo com a denúncia do Ministério Público do Espírito Santo, militares teriam arremessado Kaylan Ladário dos Santos de uma altura de 14 metros

Um vídeo anexado ao processo que apura a morte de Kaylan Ladário dos Santos, de 17 anos, mostra o momento em que os três policiais militares acusados pelo homicídio estão sobre a Segunda Ponte, que liga Vitória aos municípios de Vila Velha e Cariacica. As imagens, obtidas pela reportagem a TV Gazeta neste sábado (7), também mostram o adolescente na água, antes de se afogar no mar, no dia 18 de fevereiro deste ano. 

Também neste sábado, a Justiça derrubou o sigilo do processo em que são réus os três PMs: o cabo Franklin Castão Pereira e os soldados Luan Eduardo Pompermaier Silva e Leonardo Gonçalves Machado. De acordo com a denúncia oferecida pelo Ministério Público do Espírito Santo e aceita pela Justiça, os militares teriam jogado Kaylan de uma altura de 14 metros. 

Nas imagens feitas por câmera de videomonitoramento, os militares aparecem com a viatura parada sobre a ponte. Logo no início, um objeto é lançado na água. Em seguida, o carro dos policiais é visto deixando o local, enquanto há movimentação na água — que, segundo a denúncia, seria Kaylan se debatendo na água.

A gravação foi exibida para a mãe de Kaylan na delegacia. O vídeo faz parte das provas que embasaram a prisão preventiva de três PMs suspeitos de envolvimento na morte do adolescente. Na decisão em que determinou a prisão preventiva dos acusados, o juiz Alexandre Pacheco Carreira destacou que os três militares agiram "de forma livre, consciente e assumindo o risco de matar".

"Segundo apurado, a vítima Kaylan Ladário dos Santos teria se debatido nas águas em uma tentativa de sobreviver, porém não conseguiu evitar o seu afogamento, vindo a óbito, e os autores nada teriam feito para salvá-lo", apontou o juiz na decisão.

Relembre o caso

Na madrugada de 18 de fevereiro, Kaylan foi abordado pelos PMs no bairro Aparecida, em Cariacica, devido a um mandado de busca apreensão por um assalto em 2023, e levado para o plantão da Delegacia Especializada do Adolescente em Conflito Com a Lei (Deacle), em Vitória.  Ao chegarem ao local, os militares foram informados pela Polícia Civil que o documento estava vencido e que, por isso, ele não poderia ser apreendido.

De acordo com as investigações, os policiais, então, teriam colocado Kaylan novamente na viatura e informado que iriam levá-la até a sua casa. A denúncia do MPES aponta, no entanto, que os PMs teriam parado na Segunda Ponte e arremesado o adolescente de lá.  O corpo do jovem foi encontrado por um pescador no dia seguinte, boiando na orla de Cariacica.

Os três policiais militares são réus em um processo que apura homicídio qualificado, em razão da impossibilidade de defesa da vítima. Também pesa contra os PMs, de acordo com a denúncia aceita pela Justiça, a acusação de o crime ter sido cometido "com abuso de poder ou violação de dever inerente ao cargo", segundo o Artigo 61 do Código de Processo Penal. 

A vítima "foi surpreendida com a conduta dos acusados, que estavam em maior número, o que dificultou as chances de esboçar qualquer reação de defesa", diz o juiz na decisão que determinou a prisão preventiva dos réus. 

"Observa-se que aqueles que possuem o dever, em síntese, de garantir a segurança pública e a ordem social, a prevenção de crimes, a manutenção da ordem e o cumprimento da lei, teriam praticado o crime de homicídio consumado ora em análise, de modo que os acusados não agiram com respeito aos direitos humanos e à dignidade humana", diz outro trecho. 

A derrubada do sigilo sobre o processo atende a um pedido da advogada da família de Kaylan, feito durante a audiência de custódia dos acusados. Na ocasião, ela argumentou que o caso, por envolver agentes públicos, deveria ser de conhecimento da sociedade. "O sigilo foi decretado por envolver menor [de idade], mas entendemos que o processo tem legitimidade para ser público, que é a regra", afirmou a advogada Hiorranna Meneguci Alves, em entrevista ao Gazeta Meio Dia neste sábado (7).

Investigação aponta que jovem havia sido liberado por delegado e deveria ser levado para casa, mas foi executado durante o trajeto. Caso aconteceu no dia 18 de fevereiro deste ano

A Polícia Civil informou que o Inquérito Policial foi presidido pela Divisão Especializada de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) de Cariacica, com o indiciamento dos militares por homicídio qualificado, em razão da impossibilidade de defesa da vítima. O Ministério Público do Estado do Espírito Santo (MPES) ofereceu denúncia nos mesmos termos. 

A Associação dos Praças Policiais e Bombeiros Militares do Espírito Santo (Aspra-ES) afirmou que não está prestando assessoria jurídica aos envolvidos. A reportagem de A Gazeta tenta localizar a defesa dos policiais e deixa este espaço aberto para um posicionamento.

Relato emocionado

Na madrugada do dia 18, por volta de duas horas da madrugada, após ser constatado pelo delegado de plantão que Kaylan Ladário deveria ser liberado, os policiais tentaram entrar em contato com a mãe, Leicester Ladário, para buscar o filho, mas devido ao horário ela não ouviu a ligação. Duas horas depois, a mãe retornou a ligação, quando foi informada que a vítima não estava mais na delegacia.

Leicester Ladário, mãe do jovem arremessado da segunda ponte, relatou a angústia que sentiu com o desaparecimento do filho
Leicester Ladário, mãe do jovem arremessado da Segunda Ponte, relatou a angústia sentida pela morte filho Crédito: Pablo Campos

"Quando cheguei na delegacia disseram que meu filho esteve lá, mas foi liberado. Eu questionei os policiais por que fizeram isso sem a minha presença, e nem eles souberam explicar. Comecei a procurá-lo com os amigos, mas ninguém tinha notícias. Registrei o desaparecimento no dia 19, e o próprio delegado da Polícia Civil achou estranho ele ter sido liberado. No mesmo dia, às 16h, recebi a ligação: encontraram o corpo dele na orla. Era o meu filho", disse Leicester em entrevista ao repórter Daniel Marçal, da TV Gazeta.

Eu vi eles jogando o meu filho. Meu filho estava vivo, ele estava vivo! Eles pararam o carro em cima da Segunda Ponte e jogaram o meu filho lá de cima. Viram ele se debatendo e, mesmo assim, simplesmente entraram no carro e foram embora. Meu filho não sabia nadar. Eles viram o desespero dele

Leicester Ladário

Mãe de Kaylan

"Foi muito angustiante, porque eu tinha certeza de que meu filho não fugiu, que fizeram alguma coisa com ele. Eu sabia que os policiais estavam mentindo, mas não sabia o que, de fato, tinha acontecido. Quando vi a imagem, foi o pior momento. Pensei: ‘eu podia ter atendido o telefone, podia estar lá na hora, talvez tivesse conseguido ajudar’. Fico imaginando meu filho sendo jogado na água sem saber nadar, tentando puxar o ar e só puxando água. Foi a pior sensação da minha vida. Nenhuma mãe deveria ar por isso. Meu filho tinha só 17 anos", disse, emocionada. 

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